Capítulo 19
2184palavras
2022-12-24 14:33
- Oi.
- Oi. – Ela me falou, sem olhar na minha cara, continuando o que estava a fazer.
- O que eu faço se encontrei algo no elevador?

- Se não for dinheiro, leve para a seção de “achados e perdidos”, no segundo andar. – Ela seguiu no computador, sem demonstrar interesse no que eu dizia.
- E se for dinheiro? – perguntei por curiosidade.
Ela me encarou então, com cara de poucos amigos:
- Daí deixe aqui comigo.
Enruguei a testa. Que descarada! Certo que se era dinheiro, pegaria para ela.
- Encontrou algo? – ela questionou, agora interessada.

- Sim... – peguei uma moeda que não valia quase nada e entreguei para ela.
Ela pegou a moeda, olhou, rolou-a sobre a mão e disse:
- Pode ficar para você. – Sorriu debochadamente.
Não é uma moeda, sua idiota. Achei uma carteira do senhor Allan C. Mas você não é confiável. Eu mesma vou devolver, de um jeito ou de outro. Ele era um senhor tão gentil. Certamente estava preocupado, afinal, todos os seus cartões estavam ali. Quem não ficaria? Ainda mais com tantos... Eu quase surtei quando me roubaram um.

Quando cheguei me casa, abri a carteira em couro legítimo e com logotipo de marca masculina famosa. Me impressionei do quanto o senhor Allan C. tinha bom gosto e dinheiro. Cartões de todas as bandeiras e em grande quantidade. Mas nenhum documento com foto. De tanto mexer, encontrei um cartão de visita com endereço e telefone. Pertencia a Allan Casanova. Era antigo e tinha até o prefixo de telefone que nem existia mais.
Fui imediatamente para a internet e joguei o nome “Allan Casanova” no Google. Fiquei imóvel ao me deparar com a foto do CEO e fundador da North B. Ele era o dono do dono da porra toda. O dono da porra toda mor. Deus, e eu tinha tratado ele como atendente de RH.
Deitei na cama, querendo me suicidar. Isso que dava ter a língua maior que a boca.
Era o pai de Heitor Casanova. Conferi o endereço e não era o mesmo do cartão. Por mais que eu odiasse Heitor, o pai dele em nada se parecia com ele. E eu não confiaria a ninguém entregar aquilo a não ser eu mesma. Poderiam se aproveitar do pobre velhinho rico. Ok, não tão velhinho assim... Era até “pegável”.
Ben chegou e pedi para ele ir comigo até a mansão dos Casanova entregar a carteira do CEO mor.
A resposta dele me impressionou:
- Eu não acredito que você vai atrás de Heitor Casanova.
- Ben, eu não vou atrás de Heitor Casanova. Vou entregar a carteira de Allan Casanova.... Só isso.
Ele se jogou na cama e suspirou:
- Quem avisa, amigo é. Não se meta com Heitor, Babi. Isso já foi longe demais. Se este homem não está interessado em você, vai destruí-la.
- Claro que não... Que não está interessado em mim. E não tenho medo dele.
- Isso está fugindo do seu controle. Você está brincando com fogo... E do lado de um posto de combustível. Se não confia em ninguém que entregue a carteira do velho, manda por sedex. Vai chegar até ele, com certeza.
- Não. Vou levar pessoalmente.
- Claro... Pelo visto “você” quer mesmo brincar com foto... E se queimar.
- Bastava dizer, “não quero ir com você, Babi”. – Reclamei, indo até o quarto de Salma e abrindo o armário dela.
Ben foi atrás de mim:
- Ei, o que você quer no armário de Salma?
- Um vestido decente.
- Salma com um vestido decente? – ele gargalhou. – A não ser que... Porra, você quer seduzir o CEO filho?
- Claro que não, Ben. Eu jamais me envolveria com aquele desclassificado.
- Então por que usar um vestido de Salma, sabendo que ela só anda de peitos de fora e fendas que mostram até as calcinhas? Ou vai dizer que agora está interessada no Casavelha e não no Casanova.
- Ben... É gente rica. Eu não posso ir de qualquer jeito.
- Falou a mulher que usou tênis e jeans numa entrevista na North B. Acha que Heitor vai pensar que você é refinada por estar usando um vestido caro e mostrando os peitos? Cherry, você riscou o carro dele. Isso não tem nada a ver com classe.
- Ben, eu vou banir você do apartamento.
- E eu vou tomar banho antes de você... Vou sair com Tony.
Parei e olhei-o, com o vestido vermelho escolhido, na minha mão, com cabide e tudo.
- Por meus sais... Estou até vendo a explosão... – ele colocou as mãos na frente dos olhos. – Se você pegar Heitor Casanova de jeito, juro que chupo ele.
Arqueei a sobrancelha:
- Isso não seria muito justo comigo. Faria ele me trair.
- P-o-r-r-a! – ele gritou. – Você quer se oferecer para o Casanova. Eu sabia! Sequer sabe se ele mora lá.
- Ben, você está entendendo tudo errado.
- Vou tomar meu banho e sair com Tony que eu ganho mais.
- Pergunte sobre Sebastian Perrone, por favor. Estou... Com saudades daqueles olhos azuis do desgraçado.
- Acha mesmo que eu perderia meu precioso tempo falando sobre você e Sebastian, cherry? Faça-me o favor... – ele saiu, fechando a porta.
Contemplei o vestido vermelho vivo, na altura dos joelhos, com uma fenda enorme e as costas fechadas com um zíper dourado. Tirando a fenda, o resto era decente e tapava todo o corpo. Eu tinha um sapato preto que cairia bem com ele.
Fiz uma maquiagem leve, estilo “saí de casa às pressas” e coloquei uma calcinha minúscula, para não marcar nada. O vestido demorou para passar pela parte dos seios e depois não queria fechar.
Chamei Ben para me ajudar. Ele levantou o zíper com dificuldade e disse:
- Vai estourar. Você não cabe no vestido.
- Peso bem menos que Salma. Sempre pesei.
- Claro que sim. Só que Salma é muito mais alta que você, meu amor. E ela não tem peitos. Torça para que rasgue atrás e não na frente, senão você está fodida. E estou dizendo fodida no sentido literal da palavra, amiga.
Respirei bem fundo, repetidas vezes, observando os movimentos do vestido. Não iria arrebentar. Xixi só em caso de morte. Eu não retiraria ele em outro lugar a não ser em casa... E também não faria xixi na breve visita ao senhor Allan Casagrande.
Aproveitei que Tony buscaria Ben e pedi uma carona.
- Claro. – Tony falou gentilmente, quando estacionou o carro em frente ao nosso prédio.
Sentei atrás no carro e Ben na frente.
- Quando o lugar é fora de rota, não se chama carona e sim favor. – Ben me disse, olhando pelo retrovisor.
- Me erra, Ben. Está com ciúmes?
- Eu? Imagina!
- O que houve entre vocês dois hoje? – Tony perguntou, rindo. – Ei, quem fez este estrago na frente do prédio? – olhou meu belo presente dado por Heitor Casanova pichado na fachada.
- O que houve entre nós hoje? Tirando o fato de que minha amiga está fazendo merda, nada. Quando ao elogio na fachada do prédio, é para Babi. – Riu ironicamente. – Depois explico melhor.
- Hum, você dizendo isso, Ben? – ele olhou para meu amigo.
- Então, pra eu dizer isso, imagina o tamanho da merda que ela vai fazer, Tony.
Começamos a rir.
Assim que entramos no bairro mais rico de Noriah Norte e fui dando as coordenadas do endereço, Tony perguntou:
- Ei, Babi, onde você vai, afinal?
- Na casa de Allan Casanova.
- O que você vai fazer na casa de Allan Casanova?
- É uma longa história. Depois Ben explica para você. – falei, percebendo que estávamos chegando perto.
- Sabe que Sebastian odeia poucas coisas na vida... Mas dentre elas está Heitor Casanova. – Ele disse.
- Por quê? – fiquei curiosa.
- Talvez pelo mesmo motivo que você o odeia, cherry? – Ben virou e me encarou, dando um sorrisinho debochado.
- Algo do passado deles. Não sei exatamente o que aconteceu. Eles estudaram juntos, em outro país.
- Estranho, não é mesmo? Os dois de países completamente diferentes e estudarem juntos num terceiro.
- Elite, querida. Sempre as melhores escolas. – Ele explicou. – Não é à toa que os dois comandam grandes negócios hoje.
- Tem razão. – concordei.
Assim que Tony estacionou o carro na frente do portão de grades marrons gigantesco e com muros de mais de dois metros de altura, meu coração bateu mais forte. Me senti um pouco amedrontada com aquele lugar. A casa ocupava praticamente toda a quadra.
Alguém buzinou atrás de Tony, que dirigiu um pouco para frente. O portão se abriu e um segurança veio atender e o carro entrou, seguido de mais dois.
- Irei aproveitar a entrada destes carros e vou junto. – Desci.
- Como vai voltar, Babi? – Ben perguntou.
- Motorista de aplicativo. – Avisei.
- Chame Daniel então, linda.
- Pode deixar.
Ele abriu o vidro e me chamou com o dedo. Pegou minha mão e olhou nos meus olhos:
- Prometa que não vai fazer besteira.
- Eu prometo. Vou entrar, devolver a carteira, pedir desculpas por ter achado que ele era o homem do RH e ir embora.
- Amo você.
- Também te amo.
Respirei fundo e fui até o segurança, que mantinha o portão aberto.
- Boa noite. – Cumprimentei.
- Boa noite. – Ele foi polido. – A senhora pode entrar.
- Posso? – perguntei, surpresa.
- O senhor Casanova a espera.
- Espera? – fiquei aturdida. – Eu acho que você está me confundindo com alguém.
- A senhora... Não veio para a festa?
- Que festa?
- Do aniversário do senhor Heitor Casanova?
- Não... – enruguei a testa, confusa. – Eu sequer sabia que era o aniversário dele.
Ele ficou me olhando, também confuso. E eu entendi o movimento de carros.
- Eu vim entregar uma coisa que o senhor Allan Casanova perdeu. Na verdade, achei a carteira dele.
O homem me olhou dos pés à cabeça e disse:
- Não pode entrar.
- Mas há pouco tempo atrás você mandou eu entrar.
- Achei que tinha vindo para a festa.
- Eu encontrei a carteira do homem... Preciso devolver. Ao menos ligue, para se certificar se ele realmente perdeu. Então confirmará que não estou mentindo.
Ele me olhou desconfiado e depois pegou o telefone, do lado de dentro da guarita. Ligou para alguém e perguntou se Allan Casanova tinha perdido a carteira. Depois só respondida “Aha, sim, sim, ok”.
- E então? – perguntei, enquanto outro carro entrava.
- O senhor Allan Casanova a espera.
Comecei a andar e ele disse:
- Ei, onde você vai?
- Entregar a carteira.
- Alguém virá buscá-la, senhora. É muito longe caminhando até a mansão. Um carro a levará.
- Ok.
Aguardei, olhando para as árvores enfileiradas milimetricamente nas laterais da estrada asfaltada. A noite estava quente e a lua cheia brilhava no alto do céu. Uma noite perfeita para comemorar um aniversário em grande estilo.
Aguardei uns dez minutos até que um carro preto veio buscar-me, com um motorista mudo, certamente. Entrou na estradinha asfaltada, andando até me deixar em frente a uma casa simplesmente gigantesca, de dois andares, branca. Tinha uma espécie de rótula com flores no centro, em frente à porta principal, onde os carros paravam e uma mulher vestida elegantemente recebia as pessoas.
Bem, eu não vi uma porta secundária por onde eu pudesse entrar. Então fui até ela:
- Boa noite. Eu estou procurando o senhor Allan Casanova. – falei.
- Boa noite. Qual seu nome? – ela olhou para a lista que segurava nas mãos.
- Não vai encontrar meu nome na lista. Eu não sou convidada. Vim entregar uma coisa para o senhor Allan, como já lhe disse. Não estou aqui pela festa de aniversário.
- Como exatamente você acessou a área interna, senhora? – ela me encarou.
- Repetindo, quero falar com senhor Allan e...
- Não pode entrar. – Ela disse rispidamente.
Havia um casal chegando, vestidos elegantemente. A mulher usava um vestido longo divino e um casaco de pele que juro que parecia que ela matou um animal de verdade e colocou sobre os ombros. Claro que os dois ficaram me olhando, curiosos. E eu para eles, afinal, pareciam estar chegando na entrega do Oscar.
- Eu posso entrar por outra porta. Não quero participar da festa. – falei, já me sentindo irritada e torcendo para não fazer um barraco na festa de Heitor Casanova e ser presa novamente.
- Eu vou chamar os seguranças. – Ela disse, pegando uma espécie de telefone móvel, do tipo walkie talkie, que eu brincava quanto criança.
Fiquei ali, esperando pelos seguranças, certa de que não chegaria no dono da casa. Foi quando vi os dois seguranças vindo por trás dela, de dentro da casa.
Sorri, tranquila:
- Anon 1 e Anon 2? Sou eu. – Acenei.
- Senhora Bongiove? – Anon 1 falou, surpreso.