- Eu concordo – Allan falou – Temos muitos homens armados e treinados aqui. Se não fizermos algo agora, nunca mais será feito.
Todos olharam para Heitor. Ele me encarou. Senti que algo o incomodava, embora eu concordasse com Allan e meu irmão.
- Fale, Heitor... – fui até ele, pegando sua mão, sem tirar meus olhos dos seus. – O que você acha disso tudo?
- Eu tenho medo por Maria Lua. E se Daniel também estiver armado? E se não estiver sozinho? E se uma bala perdida acerta nossa menina? – Percebi certo pânico na voz dele.
Eu não tinha pensado naquilo. E ele tinha razão. Claro que a vontade era acabar com Daniel e todos que estivessem com ele. Mas minha filha era uma das pessoas que estavam sob seu domínio.
- Podemos tentar conversar – Ben sugeriu – Odeio violência, gente! Não que eu ache que tenhamos que ceder à chantagem deste desclassificado do Daniel, mas não custa tentar resolver na paz.
- Neste caso, não tem como resolver na paz, Ben. – Anon 1 falou para ele.
- Precisamos sim ir até lá. Mas temos que montar uma estratégia que garanta a segurança da minha filha. – Heitor disse.
- Podemos cercar o local. Temos uns dez homens armados aqui fora. As propriedades aqui nas redondezas são grandes. Conheço bem todos os caminhos. Sugiro que Heitor tente conversar, entrando pela porta da frente. Então ele saberá qual é a situação lá dentro. – Sebastian sugeriu.
- Não... Não podemos botar Heitor em risco desta forma. – Falei imediatamente.
- O que sugere, Babi?
- Eu entro pela porta da frente, disposta a conversar.
Heitor gargalhou, ironicamente:
- Nem pensar! – falou seriamente.
- Os dois... Porque não vão os dois? Não pode ser outra pessoa a não ser vocês – Allan disse – Enquanto isso, os seguranças cercam a casa. Você pode dizer que encontrou o endereço e que quer resolver de forma amigável, filho.
- Não sei se eu teria sangue frio deste jeito. – Heitor confidenciou.
- Sim, você consegue. É pela nossa filha. – Apertei a mão de Heitor junto da minha.
- Daniel é esperto. Vai saber que eles não estão sozinhos. – Ben disse.
- Gente, não podemos ficar aqui parados. É só Daniel, um otário que pediu uma casa noturna em seu nome, sendo que todos sabem que Heitor Casanova é fundador e proprietário do local. Quem pediria isso? Chega a ser ridículo! É inadmissível ficarmos discutindo, sendo que Malu está a quilômetros de distância daqui. E se estiver chorando, pedindo pelos pais? – Nic falou.
Olhei para ela... Que tinha razão.
- Vamos, Heitor. Não precisamos de um plano... Decidimos no caminho. Vamos bater na porta dele e dizer que queremos a nossa filha e o resto a gente inventa. Você não daria o dinheiro para ele, não é mesmo? – Perguntei.
- Não – ele confirmou – Anon, você cuidará da parte da frente. Não sei se a propriedade é cercada ou algo do tipo. O que importa é que Daniel não saia de lá. Otávio segue pela parte dos fundos. Ele estará encurralado. Dividam os homens lá fora. Quero todos armados e prontos para atirarem a qualquer momento.
- Vai falar com ele sem estar armado? – Allan perguntou ao filho.
- Sim, vou de mãos limpas. Como eu disse, não quero de forma alguma botar em risco a vida da minha filha. Sebastian, enquanto conversamos e distraímos Daniel, você tentará acessar a casa e ver o que está acontecendo comigo e Bárbara lá dentro. A prioridade é tirar Maria Lua, entendeu?
- Entendi. – Sebastian balançou a cabeça afirmativamente.
- Senhor, desculpe me meter, mas não seria melhor a senhora Bongiove ficar em casa? – disse Anon – É uma operação arriscada.
- Anon, você acha mesmo que eu ficaria aqui, sentada, enquanto vocês vão atrás de Malu e do filho da puta do Daniel? – coloquei as mãos na cintura – Quero uma arma.
- Nem pensar. – Sebastian falou imediatamente.
- Acha mesmo que eu daria uma arma na sua mão, Bárbara? – Heitor veio até mim e pegou minha mão – Vamos logo antes que eu tenha problemas com a minha mulher doida.
- Dom Casavelha... Diga que eu posso ter uma arma. – Implorei, virando na direção dele, enquanto Heitor me puxava até a porta.
- Não, Babi. Você não pode ter uma arma... Nem se eu fosse um mafioso lhe daria o poder de fogo.
Segui com eles para fora da casa. A noite estava fria e ainda nevava. Olhei para o céu e depois virei a minha mão, deixando a neve cair sobre a palma dela, sem sentir por causa da luva.
- Tudo bem, meu amor? – Heitor perguntou.
- Estava pensando... Se Daniel trocou a fralda de Maria Lua... E colocou bastante roupas nela. Será que lhe deu de comer?
- Eu espero que sim, Bárbara. Mas sinceramente, mesmo que ele tenha sido um bom anfitrião com nossa filha, vai morrer do mesmo jeito.
Sebastian veio na minha direção e deu-me um abraço apertado:
- Cuide-se, sua doidinha. – Falou no meu ouvido, sem me soltar.
- Peço o mesmo a você. Sabe o quanto é importante na minha vida, irmão... Não quero perdê-lo... Nunca. Vou voltar com a minha filha nos braços.
- Sebastian, você chegou a falar com o seu amigo da Polícia? Ele vai nos dar cobertura? – Heitor perguntou.
- Seu pai disse que não era para envolver a Polícia.
- Como assim? Meu pai não está em condições de ditar ordens por aqui.
- Heitor, ele não envolveu a Polícia nem quando levou um tiro a mando do meu pai. Acha mesmo que ele faria isso agora? Pelo que entendi, seu pai quer dar um fim em Daniel sem que ninguém saiba. – Sebastian falou.
- Que porra! Estou ficando louco com isso tudo. – Heitor colocou as mãos na cabeça, confuso, os cabeços ficando para cima, completamente desarrumados.
Fui até ele e peguei sua mão:
- Chega, desclassificado. Se pensarmos demais, não faremos nada do que combinamos. Vamos salvar nosso pequeno raio de sol.
Ben veio correndo atrás de nós:
- Eu vou junto.
- Ah, não vai mesmo. – Heitor disse firmemente.
- Claro que vai – desautorizei Heitor – Já fizemos coisa muito pior do que matar alguém, não é mesmo, Ben?
- Sim... Eu paguei um prostituto para comer ela e o desgraçado a roubou e...
Heitor colocou a mão na boca de Ben:
- Se continuar, mato você antes de Daniel.
Ben fez um gesto afirmativo com a cabeça, os olhos arregalados.
Entramos no carro, guiados por Anon. Sebastian foi seguido por três carros e Anon 2 e Allan levaram os demais no seu encalço.
- Ben, você não abre a boca e não desce do carro. – Heitor falou altivamente.
Ben virou para trás, nos encarando. Estava sentado no banco da frente, ao lado de Anon:
- Babi, se morrermos, quero que saiba que eu amo você...
- Depois de Malu e Anon, não é mesmo? – ironizei – Fiquei chateada quando confessou que sou a terceira na sua lista de amor verdadeiro.
Anon olhou para Ben, arqueando a sobrancelha:
- Você me ama, Ben?
Ah, porra, eu não acredito que Ben não havia dito a Anon ainda!
- Amor? Eu disse amor? Não, eu quis dizer “sentimentos profundos”. – Tentei disfarçar.
- Ben, abra o console no painel, na sua frente, por favor. – Heitor pediu.
- Agora? Sim... – Ben concordou, abrindo – O que precisa, Thorzinho? Não tem nada aqui.
- Achei que pudesse ter uma colherinha. Creio que nosso amigo Anon está precisando. – Heitor começou a rir debochadamente.
- Colherinha? Por que eu precisaria de colher, senhor? – Anon perguntou, confuso.
- Sabe o que eu mais gosto neste bando de doidos? – Ben tocou o braço de Anon – É que temos uma criança sequestrada, várias vidas em perigo e o dono da porra toda me prega uma peça perguntando se há colherinhas para o meu homem... Tenho certeza de que outro como você não existe, Thorzinho! Ao menos não tão parecido com a minha Babi.
Peguei a mão de Heitor e apertei-a contra meus dedos. A escuridão tomava conta do interior do carro e a única claridade que havia era dos faróis na estrada completamente branca de neve.
- A estrada está escorregadia – Anon falou – Não estou acostumado a dirigir na neve, senhor.
- Quer que eu dirija, Anon?
- Claro que não, senhor.
- Anonzinho consegue, Thorzinho. – Ben falou.
Quando eu ia perguntar se demoraria muito, o carro parou, de frente para uma propriedade com cerca de madeira e um portão grande, mal fechado.
- É aqui, conforme o GPS. – Anon avisou.
- Não é melhor vocês levarem uma camiseta branca, balançando para cima? – Ben sugeriu – Por que se Daniel olhar para fora e não os reconhecer... E se ele achar que é a Polícia? Bandeira branca é sinal de paz.
- Não estamos em sinal de paz, Ben. – Heitor abriu a porta do carro.
- Vou escolta-los armado, senhor. Quando chegar perto da casa, aguardo mais distante.
- Ok.
Desci do carro, sentindo o ar gélido novamente. Ben tentou abrir a porta e Anon impediu com o próprio corpo:
- Você fica aqui, Ben.
- Não... Nem pensar. Não vou ficar aqui sozinho. Se ouvir tiros eu morro do coração... E se ver fantasmas morro também. Não tem uma viva alma nesta porra de lugar.
Ben retirou uma arma de dentro do casaco e engatilhou, entregando a Ben:
- Qualquer coisa suspeita que ver, atire.
- Anonzinho, eu nunca dei um tiro na vida.
- Para tudo existe uma primeira vez. É arriscado você ir junto e não vou deixá-lo aqui desprotegido.
Ben pegou a arma cuidadosamente:
- Por meus sais... Se isto disparar acidentalmente e eu me matar?
Anon alisou o rosto dele e disse, abaixando-se em sua altura:
- Eu confio em você, ok? Vai dar tudo certo.
- Ah, Anonzinho. Eu amo você... Preciso confessar isso.
Anon nos olhou. Fiquei ali, imóvel, assistindo a tudo como se fosse uma novela no penúltimo capítulo.
- Acho... Que podemos ir andando devagar, Bárbara. – Heitor disse.
- Não... Eu quero ver o beijo. – Falei, seriamente.
- Senhora Bongiove, eu não faria isso na sua frente.
- Imagine, Anon, fique à vontade. Eu não vou me importar.
- Bárbara... Vamos, por favor. – Heitor me puxou pelo braço.
Enquanto andávamos, ele disse:
- Não entende que Anon é um homem discreto?
- Mas Ben não é.
- Bárbara, vamos!
Andamos um pouco, em direção à casa que ficava ao longe. Pulamos o portão velho de madeira, que estava cadeado com uma corrente. Havia somente uma luz fraca na varanda da casa.
A propriedade era grande, mas não tinha plantações, diferente dos demais terrenos próximos.
- Como acha que ele conseguiu este lugar? – Perguntei.
- Não sei... Não tenho ideia.
Ouvimos passos e virei para trás, assustada. Era Anon.
- Anon, como você foi capaz de dar uma arma para Ben e não dar para mim?
- Senhora Bongiove, não tem balas na arma dele.
- Mas... Você engatilhou. – Falei, confusa.
- Para ele se sentir mais seguro. Mas não vai acontecer nada ali. Logo os outros carros já estarão próximos e todos os homens estarão cercando a casa. Ben não corre perigo. Eu o protegerei... Com minha própria vida.
- Isso é fofo.
Começamos a andar mais rápido. Parecia que quanto mais nos aproximávamos da casa, mais longe ela ficava.
- Meu coração está batendo tão forte que tenho a sensação que vocês estão ouvindo-o. – Confessei.
- É normal ficar nervosa, Bárbara.
- Heitor, ficamos tanto tempo longe dela... Fico a imaginar se realmente está tudo bem com nossa bebê.
- Ele não seria louco de fazer nada contra ela, Bárbara.
- Mas Heitor, me parece que ele sabe que não vai ganhar nada disso tudo. Os pedidos dele foram completamente absurdos.
- Senhor, eu vou ficar por aqui. Consigo me esconder atrás deste arbusto e visualizar vocês daqui. Ficarei com arma em punho. – Disse Anon.
- Ok, Anon.
- Heitor, nós vamos nos separar. – Falei.
- Como assim?
- Eu vou ir na frente e bater na porta.
- Não foi este o combinado, Bárbara.
- Não pode ser nós dois juntos. Eu bato, Daniel aparece e você o pega. Ele vai estar desprevenido e confuso quando me vir.
- Ele saberá que não está sozinha.
- Precisamos ao menos tentar.
Ele balançou a cabeça:
- Você é doida.
Soltei a mão dele e segui, me distanciando um pouco. Andávamos na mesma velocidade. Conforme ia me aproximando, começava a sentir meu coração batendo mais e mais forte. E se Maria Lua estivesse chorando? E se ela não estivesse ali? E se Daniel não estivesse mais ali?
Quando cheguei na varanda, percebi luz ligada no interior da casa. Olhei para todos os lados e não avistei ninguém, sequer Anon. Heitor estava próximo da varanda, mas não entrou.
Respirei fundo e bati na porta. Minhas mãos estavam trêmulas. Demorou até que eu ouvisse passos.
- Quem é? – Perguntou a voz feminina do outro lado da porta.
Uma mulher? Aquela voz não era estranha... Enruguei a testa, tentando encontrar uma resposta:
- Sograsta? – Falei, confusa, ao mesmo tempo que a porta se abriu e vi Celine, com Maria no colo.