Quando o sinal tocou o retorno dos alunos de volta a sala, eles não se soltaram. Mantiveram o toque até mesmo quando o primeiro aluno retornou.
Sentiam tanta necessidade daquilo que apenas queriam aquilo. Era só.
Mas a chegada da próxima professora foi o que os obrigou a separar. Ainda sentindo o turbilhão e o peso das palavras e sentimento, tiveram que separar.
ㅡ Aconteceu algo? ㅡ ouviu Jaesun perguntar.
A garota ainda estava tão inerte e quieta a tudo que apenas negou. Seu peito doía, mas era de pura insatisfação. Poderia ser tão fácil se o preconceito não existisse.
Na saída para a casa, Lucy já esperava por Ryeon para seguir de volta juntos. Aguardava junto a Jaesun que não parava de olhar para o canto cujo Mark estava com um grupo alheio.
Porém o celular de Jaesun tocou, e para a surpresa, era Sun-ha.
Aquilo levou a atenção de ambos para o aparelho e quando o garoto ergueu a tela e mostrou a Lucy quem ligava, viu a garota revirar os olhos.
ㅡ Ela não me deixa trazer o celular e fica te ligando... Não entendo isso.
Jaesun sorriu, respirando fundo antes de atender a chamada.
ㅡ Senhora jeon, bom dia.
ㅡ Bom dia, Woojin está com você?
ㅡ Não o vejo... ㅡ respondeu sacana. Lucy negou. ㅡ Espere, acho que o vi.
ㅡ Ótimo, pode avisar a ele que estarei passando ai em dez minutos? Buscarei ele.
ㅡ A senhora sabe que existe ônibus, certo? E ele é seguro.
ㅡ Deixe de ser bobo garoto. Faça, por favor, o que eu pedi.
ㅡ Ok, ok, avisarei sim.
ㅡ Obrigada.
Encerrando a ligação, Jaesun fez careta para o celular, fazendo a garota rir.
ㅡ O que ela queria? ㅡ perguntou Lucy.
ㅡ Te buscar. Avisou que em dez minutos chegaria aqui.
ㅡ O quê? Por quê?
ㅡ Não disse, somente mandou avisar.
Lucy bufou, e justamente na hora em que Ryeon saia da escola.
ㅡ Vamos? ㅡ chamou-a.
ㅡ Não dá, minha mãe pediu para esperá-la aqui, ela virá me buscar.
ㅡ Sério? Por quê?
ㅡ Não sei...
ㅡ Ah, tenho que ir. ㅡ ouviu Jaesun falar. ㅡ Até amanhã, gente.
Caminhando para longe, Lucy e Ryeon observaram-no saltitar. Mark estava na esquina com seus livros, e sorria enquanto o olhava como bobo.
ㅡ Qual é a deles? ㅡ perguntou Ryeon.
ㅡ Estão juntos, então estão cheios de boiolagem. ㅡ respondeu Lucy. ㅡ e das pesadas.
ㅡ Como a nossa. ㅡ brincou parando em frente à garota.
ㅡ Não há nós, Ryeon, já te disse.
ㅡ Não vou desistir, garotinha. ㅡ disse segurando a bochecha dela. ㅡ sou persistente, você sabe.
ㅡ Se sei. ㅡ respondeu com a bochecha ainda sendo esmagada. ㅡ pode parar agora?
ㅡ Posso te dar um beijinho?
ㅡ Está louco? ㅡ arregalou os olhos.
ㅡ É brincadeira. ㅡ sorriu divertido.
A garota se desfez do toque e encostou-se ao muro, buscando por uma sombra enquanto aguardava.
ㅡ Você vai perder o ônibus. ㅡ disse para Ryeon.
ㅡ Não vou te deixar sozinha.
ㅡ Eu sei me cuidar, Ryeon.
ㅡ E eu sei disso. Eu só quero ficar. Vai me proibir?
ㅡ Eu deveria.
ㅡ Faça e eu te roubo um beijo bem aqui.
ㅡ Que cisma de beijo é essa, hein?
Ryeon mordeu o lábio com seu sorriso sacana outra vez, parando a frente da garota e próximo demais.
ㅡ Você beija muito bem.
ㅡ Obrigada?
ㅡ Não vai dizer que eu também beijo? ㅡ indagou indignado.
ㅡ E como eu saberia? Eu só beijei você na vida...
ㅡ Aigoo, que coisa. Diga, fale.
Lucy sorriu erguendo o nariz.
ㅡ Me force.
ㅡ Quer mesmo? ㅡ Aproximou-se Ryeon balançando as sobrancelhas.
A garota riu alto, tocando o centro do peito do garoto com as duas mãos, impedindo que ele se aproximasse.
ㅡ As pessoas estão nos olhando ㅡ falou Lucy.
ㅡ É porque somos bonitos. Vamos mostrar como ficamos ainda mais juntos.
A garota não conseguia controlar o riso ali. Soava tão fácil e puro. E sabia que mesmo com toda a vontade de ambos por mais beijos, aquilo não passava de uma pura e inocente brincadeira.
Estavam juntos quando Sun-ha parou o carro, e estava sorrindo quando a buzina alta soou desesperadamente sem intervalos.
O som alto chamou a atenção de ambos e quando perceberam de quem se tratava, separaram com o susto.
ㅡ Eita lasqueira. ㅡ falou Ryeon, baixo e amedrontado.
Lucy sorriu para a mãe, afastando-se de Ryeon e caminhando até o carro.
Virou-se antes de adentrar e com as bochechas cor de rosa disse acenando: ㅡ Tchau.
Ryeon acenou de volta, tão quieto e assustado que chegou a ser engraçado. Sussurrou a despedida de volta e viu Lucy ir embora com a mãe.
O silêncio foi o que preencheu o carro quando Lucy o adentrou, e quando já estavam na estrada o nervosismo parecia aflorar de sua pele.
ㅡ O que foi aquilo? ㅡ ouviu sua mãe perguntar.
Engoliu em seco sem olhá-la.
ㅡ O quê?
ㅡ Na frente de sua escola. O que acha que estava fazendo daquele jeito com Ryeon?
ㅡ Não estávamos fazendo nada.
ㅡ Nada? ㅡ a mulher aproveitou o sinal vermelho para olhá-la. ㅡ Eu pensei besteira, sabia? Imagine quem viu também.
ㅡ Que besteiras, mãe?
ㅡ Que besteiras... Você é um homem, aquilo lá é jeito de se portar? As pessoas pensam coisas.
Lucy entendia bem do que sua mãe estava falando, mas era tão chato.
ㅡ Pessoas são pessoas. ㅡ comentou baixo.
ㅡ O quê? ㅡ a mulher perguntou voltando a dirigir.
ㅡ para onde estamos indo?
ㅡ Para o mercado.
ㅡ Mas, você nunca precisou que eu fosse ao mercado. Eu tenho lição de casa, sabia?
ㅡ Shh, fique quieto. Há motivos para te levar.
ㅡ Claro que há, vamos ver quem custa mais, o óleo ou o arroz.
A mulher sorriu, olhando sutilmente para o rosto de Lucy.
ㅡ Assim você não terá como reclamar quando eu falar em casa dos preços. Você mesmo irá ver os absurdos.
ㅡ Uhum, que empolgante...
A garota simplesmente queria sumir.
Mas não tinha como, então foi obrigada a acompanhar sua mãe mesmo assim. Viu-a buscar um dos carrinhos do mercado e apenas a acompanhou.
ㅡ Posso pegar leite de banana? ㅡ pediu Lucy.
Era simplesmente viciada naquilo.
A mãe assentiu, mas quando a garota iria sair animada para buscar sua bebida na sessão designada, sentiu a mãe segurar-lhe pela mão e abrir o maior sorriso que podia.
ㅡ Seja educado. ㅡ disse entredentes.
Lucy franziu o cenho, mas olhando adiante, pode ver o motivo do estranho modo de agir da mãe.
ㅡ Você não fez isso, mamãe...
ㅡ Shh. ㅡ falou uma última vez antes de falar: ㅡ Cho Yeo, você veio.
A recém-vizinha aproximou-se, sorrindo e abraçando Sun-ha assim que parou.
ㅡ Foi difícil chegar aqui? ㅡ perguntou olhando Cho.
ㅡ Um pouco, sem GPS não conseguiria viver. ㅡ brincou.
Lucy permanecia parada ao lado da mãe, e sentiu-a ainda com seu braço entre os dedos, puxá-la.
ㅡ Trouxe Woojin. Na verdade, ele quem pediu para vir quando soube que talvez Kimi viesse com você.
Os olhos da garota dobraram de tamanho quando ouviu a mentira descarada da mãe ali. Lucy realmente queria sumir.
ㅡ Oh, Kimi, como está bonita hoje. ㅡ Sun-ha falou. ㅡ Não é, Woojin?
Lucy sorriu olhando a garota à frente, mas de fato, a garota estava mesmo bonita. Vestia um macacão amarelo mostarda junto a uma blusa branca. Seus all-star combinavam perfeitamente, enquanto um sutil laço na cor azul-celeste quebrava tudo. Lucy achou-a linda.
ㅡ Tudo bem? ㅡ Kimi aproximou-se enquanto as mulheres mais velhas conversavam. ㅡ Não pude ir hoje à escola, mas amanhã já irei. Podemos ir juntos.
Lucy ainda não sentia intimidade para andar ou até mesmo falar tão livremente com a garota como ela já o fazia. Mas não queria ser rude nem nada disso, então respondeu-a:
ㅡ Sim, podemos. Meu... Meu amigo, Ryeon, também irá. Ele me acompanha todos os dias.
ㅡ Oh, Park Ryeon?
ㅡ Você o conhece? ㅡ franziu o cenho.
ㅡ Não, mas, mamãe disse esse nome hoje pela manhã. Ela falou com o diretor do colégio e ele disse que Park Ryeon me mostraria tudo.
ㅡ E precisa? ㅡ indagou sem pensar. ㅡ você só vai estudar por dois meses lá.
Kimi deu de ombros. ㅡ Eu sei, mas não fui eu quem escolheu. ㅡ sorriu.
ㅡ Tudo bem, Ryeon vai te mostrar tudo...
ㅡ Ele é legal? Espero poder fazer amigos lá, já que conheço somente você.
ㅡ Ele é legalzinho sim.
ㅡ Legalzinho? Vocês não são amigos?
Amigos? Somos mais que isso. Nos beijamos e ficamos de chamego. Foi o que Lucy pensou, instantaneamente, porém, não foi o que respondeu-a.
ㅡ É, digamos que somos. Nós nos conhecemos desde crianças. Ele mora algumas ruas depois da nossa.
ㅡ Oh, é mesmo? Que legal.
ㅡ Mas acho que você vai gostar mais dos outros, sabe? Têm Kuan também, ele é super legal. Você deveria ser amiga dele também.
ㅡ Super legal?
ㅡ Uhum. Legalzão.
ㅡ Woah, estou tão ansiosa. Espero que todos gostem de mim.
ㅡ Vão sim. ㅡ sorriu sem jeito. ㅡ Se me der licença, eu vou à sessão de leites.
ㅡ Ah, eu vou com você.
Lucy realmente não queria ser rude.
Ouviu Kimi tagarelar por minutos incessantes, e quando enfim chegou ao fim das compras com sua mãe, quase agradeceu-a.
ㅡ Passem qualquer dia lá em casa. ㅡ Sun-ha falou, sorrindo para mãe e filha. ㅡ Principalmente você Kimi. Woojin anda estudando muito as noites, talvez você pudesse estudar com ele também.
Vergonha. Era tudo o que Lucy sentia.
Claramente sua mãe estava forçando algo que nunca aconteceria ali, mas a garota ainda não tinha autonomia para dizer sim ou não nas coisas cujo tivesse envolvida, então apenas se despediu quando teve sua chance e adentrou o carro, louca para ir para sua casa.
ㅡ Aigoo, custava você ter sorrido mais? ㅡ Foi a primeira coisa que Sun-ha indagou ao adentrar o carro.
ㅡ E custava à senhora ser um pouco mais sutil?
ㅡ Diz de você e Kimi?
ㅡ Digo do que a senhora está inventando. Não há eu e Kimi, e não haverá já aviso.
ㅡ Aish, perto de completar dezoito anos e terminar o colégio, você não sente vontade de namorar, não?
ㅡ Sinto mãe, sinto muito. Mas quando eu quiser namorar, eu irei. A senhora não precisa dá de cupido pra isso.
ㅡ Mal-agradecido, é isso que você é.
ㅡ Estou cansada, podemos ir?
A mulher estava prestes a dar partida no carro, mas parou e olhou Lucy.
ㅡ Por que se referiu a si no feminino?
Lucy foi pega de surpresa. Nunca dava deslizes na frente de sua mãe.
ㅡ Eu não.
ㅡ Você sim. Que coisa, preste atenção. Até suas palavras estão trocadas assim?
A garota suspirou pela quinquagésima vez aquele dia. Sentia-se extremamente cansada.
Seguiu o caminho de volta quieta e agradeceu internamente por sua mãe ficar do mesmo jeito.
Sorriu ao adentrar a casa e encontrar seu pai na cozinha, então correu para prender os cabelos e lavar suas mãos.
ㅡ O que está fazendo?
ㅡ Bolinhos de arroz.
ㅡ Oh, Ryeon? ㅡ sorriu. ㅡ deixe-me fazer também.
O pai assentiu, mas a mãe negou, adentrando a cozinha também.
ㅡ Nunca entendi isso de você chamar o bolo de arroz de Ryeon.
ㅡ Você não se lembra? Ryeon tinha bochechas gorduchas e se mordia de raiva quando chamavam-no de mochi. É para implicar.
ㅡ Mesmo assim, não acho adequado ficar chamando pelo nome do seu amigo homem um bolinho. É estranho.
ㅡ É legal. ㅡ Respondeu Jungso. ㅡ e ande, me ajude. ㅡ olhou Lucy.
Sun-ha apenas negou, deixando as poucas sacolas sobre o balcão e subindo as escadas para o seu quarto.
Lucy sorria a cada vez que enrolava um novo bolinho e esse saía torto. Seu pai apreciava tudo, sentindo-se bem por ter aquele pequeno momento.
ㅡ Sua mãe foi te buscar no colégio? ㅡ perguntou-a.
A garota assentiu, inerte a tudo, dando o seu melhor para enrolar mais um bolinho.
ㅡ E ela levou a vizinha Cho?
Lucy ergueu o olhar, fitando o pai.
ㅡ Então o senhor também sabia disso?
O homem negou. ㅡ Não concordei, que fique claro.
ㅡ Eu não gosto do que ela está fazendo, papai. Isso sufoca.
ㅡ Eu sei, eu já falei com ela, mas ela não para, o que posso fazer?
ㅡ Ela parará quando eu se for. ㅡ soltou.
ㅡ Ir? Ir para onde?
Outra vez a garota fitou o pai, mas desta vez ela soltou o bolinho e suspirou.
ㅡ Pretendo tentar a faculdade de Seul.
ㅡ Seul? Mas, há faculdades boas aqui em Busan.
ㅡ Eu sei, pai, mas... É o que eu quero.
O homem olhou bem a filha, por segundos sem fim, mas suspirou ao perguntar:
ㅡ E como pretende se manter lá?
ㅡ Pensei em arrumar um trabalho de meio período... Talvez dê para pagar os livros e comida.
ㅡ Não se preocupe com os livros, eu pagarei por tudo.
ㅡ Não precisa pai...
ㅡ Precisa. ㅡ sorriu. ㅡ Seria assim se fosse aqui, porque lá seria diferente?
A garota sentiu o peito esquentar, vendo que seu pai já aceitava a ideia de vê-la indo em busca do que queria.
ㅡ Você acha que a mamãe vai entender?
ㅡ No começo não, mas... Ela não vai te impedir não é?
Lucy negou, deixando o último bolinho e sorrindo ao ver que ao menos aquele saiu completamente redondo.
ㅡ Vou subir, tomar um banho. ㅡ avisou.
ㅡ Oh, tire seu fardamento, sua mãe irá lavar.
ㅡ Irá agora?
ㅡ Sim. Ela pediu para que eu separasse as roupas e deixasse-as prontas, mas não quis mexer nas suas. Se você não subir e separá-las, logo ela vai surtar.
Lucy sorriu assentindo, virando-se tranquilamente. Mas rapidamente as lembranças do que havia feito mais cedo veio à mente.
Foi tola, sabia, mas havia mais uma vez buscado suas saias e dado uma olhadinha ainda as almejando.
Mas o problema é que com isso, Lucy atrasou-se para a escola. Fazendo com que todo aquele problema em dividir o lanche com Ryeon acontecesse, e não reclamaria daquilo, jamais. Ela havia gostado muito. O problema mesmo eram as saias, que continuavam sobre a cama, apenas cobertas por um edredom grosso. Mas Lucy sabia que sua mãe retiraria-o para procurar roupas sujas debaixo, e assim, todo o seu mundo desabaria.
Correu o mais rápido que pôde sob os degraus, e com sua mochila batendo contra as costas e os cabelos nos olhos, adentrou o quarto.
A porta estava aberta, um mau sinal, e no centro do quarto, estava o cesto com roupas sujas.
Roupas que ela usava no dia-a-dia. Roupas que não tinham problemas nenhum por serem "masculinas".
Porém, sob a cama descoberta e bagunçada, estavam as "femininas".
Algumas das saias de Lucy estavam espalhadas, reviradas. E nas mãos de sua mãe, que permanecia parada e assustada, estava uma cujo os babados rodeavam-a por completo.
Lucy sentiu o peito doer e os olhos arderem. Sua mãe não parecia feliz.
Olho-a de lá, ainda com a saia nas mãos, e esmagando-a com força enquanto fechava os punhos, perguntou:
ㅡ O que isso significa?